Eu trocaria a eternidade por essa noite 💔
Quando o luto se torna patológico. //APRESENTAÇÃO_TATIANE2
Era domingo de manhã. 15 de março de 2015. Acordei por volta de 9h30, 10h. Tinham oito chamadas não atendidas do meu cunhado, Geovane, no celular.
Sinto meu coração acelerar — quase saindo pela boca.
Ligo pra ele:
— Alô?
— Está sozinha?
— Sim.
— Então desliga o telefone.
A sensação de pavor tomou conta de todo o meu corpo. O que diabos estava acontecendo?
Mal sabia eu que aquele seria o início do fim da minha vida.
Na verdade, essa história começa em 22/03/1990. O dia em que eu nasci. Sou a caçula de uma família de quatro irmãs.
Minhas irmãs foram todas programadas para nascer: a cada três anos, uma chegava. Passados doze anos da terceira, eu nasci. Completamente do contra. Contrariando as estatísticas.
Minha mãe, aos 38 anos, de cabelos brancos e achando que estava passando pela menopausa — naquela época, consultas ginecológicas, ultrassons e pré-natal elaborado… não eram comuns.
Apesar do susto de ter mais um bebê na família, que já estava obviamente completa, a aceitação da minha chegada foi genuinamente amorosa - principalmente pela minha irmã mais nova, Luciana ❤️
A diferença de idade entre minha mãe e eu é tão grande que eu via em Lu um estepe para o que é considerado “mãe” na sociedade. Ela cuidava de mim realmente como uma mãe dedicada deveria cuidar.
Quando eu fui pra escola era ela que comprava meu material escolar, escrevia em meus cadernos, me ensinava dever de casa, observava se eu precisava de uniformes ou tênis novos.
À medida que eu crescia, as fases só mudavam — mas a dedicação maternal era a mesma. Quando tive meu primeiro namorado, foi a ela que recorri em busca de conselhos amorosos… e também de métodos contraceptivos. Quando passei no vestibular, foi ela que me levou de mala e cuia para a casa nova.
Ela. Ela. Ela. Sempre ela. Minha Luciana!
Essa proximidade com a minha irmã acabou me afastando da minha mãe. Não de forma literal, como um elo rompido — sempre fomos uma família unida e minha mãe sempre esteve ali, com suas preocupações maternas. Mas com a Lu, e com o gap gritante de idade entre mim e minha mãe, ela acabou ocupando um lugar que acredito ser mais de avó do que de mãe. Muitas conversas que eu tinha com a Lu, eu não conseguia ter com a minha mãe. A geração dela não compreendia a minha. E muitas coisas que eu fiz (e faço), para minha mãe são completos absurdos!
Voltando à ligação do meu cunhado naquele fatídico dia: ele havia interrompido a chamada para entrar em contato com um amigo meu da faculdade, para que esse amigo fosse até minha casa. Eu não deveria ficar sozinha — a notícia que ele me daria mudaria a minha vida para sempre.
Minha irmã. Minha Luciana. Minha Lu. Tinha sofrido um AVC. Um aneurisma. Do pior tipo possível. Nem os médicos conseguiam explicar como uma pessoa tão jovem — na época, minha irmã tinha 37 anos — poderia passar por aquilo. Não era comum nessa idade.
Eu precisava viajar para minha cidade natal o mais rápido possível. Lu estava em coma, na UTI, e, provavelmente, só um milagre a salvaria.
Fiquei completamente paralisada. Congelada. Não acreditava que aquilo estava acontecendo. De novo. Eu já tinha perdido minha irmã mais velha, Rosimeire, para o câncer, menos de um ano antes. Mas isso é assunto pra outro post.
Em estado de choque, completamente perdida, liguei de volta para o meu cunhado e disse que não tinha condições de viajar sozinha depois de receber uma notícia tão estarrecedora. Mas que viajaria no dia seguinte — eu estava a umas 12h de distância.
Meu cunhado insistiu. Acredito que ele temia que eu não conseguisse me despedir. Mas eu estava em pânico. Sem a menor possibilidade.
“Os nossos nomes que têm o N como elo” — Nando Reis
TatiaNe & LuciaNa
Jamais vou me perdoar por ter deixado minha Luciana morrer sem saber que nossos nomes têm o N como elo.
Como eu pude não cantar essa canção pra ela???
Na segunda-feira de manhã, meus amigos praticamente me carregaram até a rodoviária de Rio Paranaíba, cidade onde eu estudava na época. Depois das tais 12h, que mais pareceram uma eternidade, cheguei em Caratinga.
A situação beirava a loucura. Meus pais, idosos. Minha irmã, com um filho de 10 anos que, na época, não se dava bem com o pai — então estava sob os cuidados da nossa família. Rotina de UTI de hospital público. Visitas todos os dias. Pega o boletim do médico. Nenhuma melhora. Apenas o estado de “estável”.
Esse pesadelo durou uma semana.
Costumo dizer que, até no leito de morte, minha linda Luciana foi gentil comigo. Ela esperou passar um dia do meu aniversário — 22/03 — para partir.
Na manhã da segunda-feira, 23/03/2015, alguém liga do hospital pedindo que um responsável vá até lá: seria necessária uma intervenção cirúrgica, e precisavam de uma autorização. Entrei imediatamente em alerta. Que intervenção era essa, do nada, se na visita anterior estava tudo “estável”?
Meu pai correu pro hospital. Minha irmã foi direto do trabalho.
E uma mulher intuitiva nunca falha.
Minha Luciana havia falecido de madrugada. E o protocolo não permitia dar a notícia por telefone.
Eu estava sentada no sofá, quando, mais ou menos meia hora depois, meu pai passou pela porta da sala e, olhando pra mim, disse desesperado:
“Morreu. Morreu.”
Segundos depois, minha irmã entra, aos prantos, praticamente carregada pelo meu cunhado.
Daí pra frente… eu não enxerguei mais nada. Velório. Enterro. Quem foi. Quem não foi. Não sei explicar nada do que aconteceu.
Fui tomada por um torpor que sinto que me pertence até hoje — dez anos depois.
“Eu trocaria a eternidade por essa noite.”
Sim! Essa noite da foto.
Onde sorrimos espontaneamente, tendo a cumplicidade como nossa maior aliada.
Perder minha irmã me adoeceu. Até hoje mal consigo levantar da cama. Às vezes sinto uma dor insuportável. Às vezes, tristeza. Às vezes fico com raiva dela por ter ido embora e me deixado aqui, “sozinha”. Como se ela tivesse culpa.
Já perdi as contas de quantos psiquiatras consultei, quantos medicamentos tomei, quantas sessões de terapia fiz. Nada funcionou.
Foi aí que descobri a expressão luto patológico — quando você percorre todos os estágios do luto em um Loop infinito.
Hoje, acredito que isso que aconteceu não é algo a ser “superado”. Algumas pessoas insistem em dizer:
“Ah, mas a sua irmã não ia querer te ver triste.”
Por favor: não seja essa pessoa na vida de alguém. A minha irmã morreu. Ela não está mais aqui. Não dá pra saber o que ela gostaria ou não.
Enfim, se tem uma coisa da qual tenho certeza é do quanto eu amei Luciana em vida, e do quanto fui amada de volta.
Ela era a minha pessoa neste plano. Ela é a minha pessoa! E sei que continuo amando. E sei também que ainda vou amar. Pra sempre!
Até o dia da minha morte. Quando eu não puder mais respirar. Quando a luz dos meus olhos se apagar!
Deixo abaixo, em memória da minha irmã, e na voz doce da Sandy, uma canção que eu sei que o universo fez dedicada a ela. “Cantiga por Luciana” Ouça! E se puder, emane boas energias para o meu ser de Luz ✨